Violando os limites da ética e do bom senso, crianças de 1 a 5 anos são transformadas em fonte inesgotável de produção de provas em processos litigiosos.
Com o advento das novas tecnologias, é notório o inchaço dos processos judiciais com um número crescente de links com gravações de áudio e vídeo de aplicativos e centenas de prints de mensagem por aplicativo entre os pais. Antes disso, já nos deparávamos com as transcrições de áudios, as inúmeras fotos do cotidiano da criança, dos seus genitais (comuns nos casos com denúncia de abuso sexual), emails que descrevem a masturbação da criança etc. Assim, tudo o que envolve a criança e os genitores em disputa passa a ser utilizado como prova para demonstrar muitas vezes que a mãe é uma “louca alienadora” ou o pai é um inepto, intransigente ou monstro abusado. Tudo isso, cabe dizer, sob a alegação de proteção aos direitos da criança.
O argumento de que, especialmente, as crianças de 1 a 5 anos são fontes inesgotáveis de produção (em série) de provas se justifica diante do fato de que, nessa faixa etária, elas são particularmente dependentes das mães por conta do apego emocional e da amamentação, por exemplo. As crianças nessa idade NÃO tem compromisso com a verdade dos pais ou com a “verdade dos fatos”. Assim, elas dizem qualquer coisa de qualquer forma porque, afinal, o pai ou a mãe lhe fez uma pergunta (a qual será gravada e, posteriormente, incluída no processo judicial). Elas dormem em qualquer lugar ou a qualquer tempo porque querem, porque precisam, e não porque a mãe ou o pai proibiu a soneca (só para incomodar o outro genitor no dia previsto para a convivência, insistem alguns).
Essas questões, e outras que pululam dos processos judiciais, talvez pudessem ser resumidas na seguinte ideia: o que quer que a criança judicializada, nesse momento peculiar de desenvolvimento, faça, diga ou manifeste, poderá ser interpretado de inúmeras maneiras. Aliás, cabe assinalar, nunca se viu tanto “especialista em desenvolvimento infantil” como atualmente as ações em Varas de Família.
Assim, diante do fato de que esses processos estão sob “segredo de Justiça”, vemos, na prática, o ocultamente na violência (sutil, outras vezes nem tanto) perpetrada contra crianças que são, a um só tempo, transformadas em fontes de prova e “objetos” de disputa no judiciário.
Quem sabe um dia, tal forma de violência contra a criança (objetificada e judicializada) também seja de pauta de discussão para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA)?