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“Autoalienação parental”: o argumento psicojurídico que tenta ultrapassar críticas à lei da alienação parental.

Anos atrás, me deparei com a expressão “autoalienação parental”, empregada por autores da área do Direito favoráveis à teoria da Síndrome da Alienação Parental (SAP) e defensores contumazes da Lei n. 12.318/2010 sobre a alienação parental (LAP). Na época, avaliei que tal expressão era parte de certa produção discursiva em torno da alienação parental (AP) no Brasil, como demonstrado em pesquisa realizada (SOUSA, 2010).

Em 2017, com a emergência dos movimentos de mulheres e profissionais contrários à teoria da SAP e à LAP no Brasil, fiz um novo mapeamento sobre os desdobramentos do dispositivo alienação parental − em uma acepção foucaultiana −, que foi publicado em 2019 sob o título “A (re)produção do dispositivo (síndrome) da alienação parental no Brasil” (ver link na bio).

Daquele mapeamento, ficou de fora o uso da expressão “autoalienação parental”. Porém, noto que hoje ela vem se tornando a nova coqueluche, particularmente, entre operadores do Direito, defensores da teoria da SAP e da LAP.

Minha hipótese sobre o assunto é que, com a promoção dos discursos jurídicos sobre a “autoalienação parental”, notadamente embasados em certa psicologia do senso comum, há uma tentativa de se ultrapassar as críticas no campo social sobre a LAP e o grande número de acusações de prática de AP que ela vem favorecendo especialmente contra as mães (ver link de pesquisa sobre a jurisprudência na bio).

Ou seja, por meio da retórica da “autoalienação parental” se promove a ideia de que, nem sempre nas situações de disputa de guarda de filhos há um alienador tirano e vingativo, como costumam ser caracterizados os genitores acusados da prática de AP. Haveria também aquelas em que o genitor que alega ser excluído da vida dos filhos é na verdade um agressor, cruel e odiento, o que justificaria a recusa dos filhos em conviver com ele.

Tal retórica, além de não responder às críticas sobre a LAP, alimenta certa invasividade jurídico-penal sobre as relações familiares, valendo-se para isso dos “especialistas da subjetividade”, os quais fornecerão avaliações na forma de documentos escritos para o Estado-juiz melhor punir os considerados anormais nas famílias em conflito.

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